Governança, o pilar "G" de ESG

Se sua empresa quer implementar estratégias sustentáveis, vai precisar entrar a fundo no pilar da Governança Corporativa, o “G” da sigla ESG.

Introdução ao ESG

Antes de falarmos sobre a Governança Corporativa é importante te explicar um pouco mais sobre a sigla ESG, que é a junção das letras iniciais das palavras environmental, social and governance (do inglês, ambiental, social e governança). Esse termo também é conhecido pelas iniciais ASG (usando as palavras em português).

Esse termo apareceu inicialmente no relatório Who Cares Wins (Quem se Importa Vence), do Pacto Global da Organização das Nações Unidas (ONU).

Nesse contexto, o aspecto da governança envolve assuntos relacionados à conduta corporativa, na composição da diretoria e do conselho, em como se garante a ética e transparência no funcionamento da empresa, no compliance e na solidez financeira da organização.

Ao longo desse artigo eu vou focar na letra G do ESG, que vem da palavra “Governança”. Caso você se interesse pelos outros pilares, já falamos sobre eles nesses artigos abaixo:

A Govenrnaça Corporativa

Quando falamos sobre ESG é comum ver as empresas se preocupando bastante com os 2 primeiros pilares Meio Ambiente (E) e Social (S), mas é impossível pensar na implementação de estratégias sustentáveis sem uma boa governança corporativa.

De acordo com o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), a governança é um recurso que traduz os princípios e valores de uma organização em ações que possuem um impacto positivo na gestão da empresa.

Na prática, a governança engloba o conjunto de estratégias e ações que são realizadas para fortalecer a cultura da empresa e o controle dos processos internos de forma ética, repeitando normas, leis e evitando práticas desleais e corrupção.

Para chegar nesse patamar desejado de boas práticas, uma palavra que vamos explorar mais é o compliance, que é um conceito advindo da expressão em inglês “to comply with” – que significa estar em conformidade – e representa as ações que as organizações realizam para direcionar suas atividades com base nas regras e leis do setor e região onde atua.

Esse conjunto de ações e regras vão ajudar no alinhamento do interesse da empresa em relação aos seus principais stakeholders (públicos de interesse), que podem englobar gestores, acionistas, investidores, clientes, fornecedores, comunidade do entorno, órgãos do governo e outros.

Mas para entender como chegamos no nosso momento atual e nessa realidade, vale a pena entrar mais a fundo na evolução desses mecanismos de regulação e conformidade.

Evolução da Governança Corporativa

Abaixo te deixo com alguns marcos da história relacionados à Governança Corporativa. Deixa eu começar falando sobre um acontecimento importante nos Estados Unidos:

  • A quebra da Bolsa de Nova Iorque, em 1929, motivada por fraudes ocasionadas pelo excesso de liberdade em contratos privados, foi um dos marcos iniciais da governança corporativa
  • A partir dessa crise, que afetou o mundo inteiro, foi criada a Securities and Exchange Commission (SEC) nos Estados Unidos, órgão equivalente à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) no Brasil com o objetivo de evitar essas fraudes, fazer cumprir as leis e proteger investidores.
  • Dessa forma, empresas de capital aberto começaram a adotar práticas de governança com o objetivo de proporcionar transparência aos agentes envolvidos na empresa.

Com a evolução dessa preocupação ao longo dos anos, surgiram alguns marcos nos EUA e no mundo:

  • Em 1977 foi fundada a NACD (National Association of Corporate Directors) ou na tradução, Associação Nacional de Diretores Executivos
  • Já em 1992 é publicado o The Cadbury Report, um código sobre governança corporativa que serviria como um guia para a alta gestão de corporações no Reino Unido e no mundo (em 1997 “deu lugar” ao The Hempel Report, a primeira revisão desse documento)
  • Desenvolvido a partir de 1998, os princípios da OCDE criaram uma lista de princípios básicos com orientações práticas e sugestões para empresas
  • Em 2001 o colapso da empresa Enron revelou um gigantesco esquema de manipulação de balanços e falhas em auditorias
  • Esses problemas motivaram a criação nos EUA da Lei Sarbanes-Oxley, ou SOx, criada em 2002 para proteger os investidores e stakeholders de empresas contra possíveis fraudes financeiras.
  • Um pouco mais a frente, em 2009, temos a publicação da Norma Técnica ISO 31000 sobre gerenciamento de riscos

No Brasil, é possível notar um fortalecimento da governança a partir da década de 1990, com as privatizações e a promoção da abertura de mercado. 

  • No ano de 1995 acontece a criação do Instituto Brasileiro de Conselheiros de Administração (IBCA), que passa a se chamar Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) em 1999
  • A partir de 2001, as mudanças introduzidas pela Lei 10.303, que tinha objetivo de fortalecer a transparência e a dispersão de acionistas no mercado de capitais, foi importante para a disseminação das práticas de governança corporativa

Segundo o relatório “Risco, Governança Corporativa e Compliance”, da Fortune Business Insights, as atividades ligadas à governança corporativa movimentaram, em 2020, cerca de US$ 27 bilhões no mundo. Para 2028, a estimativa é que esse valor chegue a US$ 75 bilhões.

No entanto, no Brasil, essas medidas ainda estão em estágio inicial. De acordo com a avaliação do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), a pontuação das empresas de capital fechado sobre a adoção de programas de governança corporativa é, em média, de 34,6 em uma escala até 100.

4 Fundamentos da Governança Corporativa

Se você quer ter sucesso no pilar de Governança do ESG, vale a pena iniciar entendendo um pouco mais dos 4 fundamentos da Governança Corporativa:

  • Transparência – tem relação com a abertura administrativa da empresa para seus stakeholders
  • Equidade – envolve colocar os stakeholders em um mesmo patamar de direitos e responsabilidades
  • Accountability – tem relação com adotar uma política de prestação de contas baseada em documentação clara
  • Responsabilidade – envolve seguir ideais de sustentabilidade e eficiência na operação do negócio

Esses são os 4 pilares que vão servir de guia para a sua organização, mas se você quer realmente gerar impactos, é possível já começar com algumas ações práticas que podem fazer com que a sua governança melhore no curto prazo.

Oportunidades nos Aspectos de Governança

Deixa eu te mostrar algumas dicas iniciais em relação à governança corporativa:

  • Ética – Esse talvez seja o pilar mais importante na atuação em relação à governança, pois ele vai ser um norte para todos os outros. Por isso os gestores da empresa devem praticar o respeito e a empatia com todos os stakeholders envolvidos, criando uma cultura de integridade. Ter um código de ética é o primeiro passo nesse sentido.
  • Prestação de Contas – Para começar a sua empresa pode apresentar de forma clara seus resultados e operação em relatórios. Os principais e mais indicados são o Relatório de Sustentabilidade, que indicamos que seja baseado nas normas e padrões do GRI (Global Reporting Initiative) e o Relatório Financeiro.
  • Transparência com Stakeholders – Um outro aspecto bem importante da governança corporativa é manter um canal direto de comunicação com clientes, fornecedores, colaboradores e outros stakeholders. Criar um canal de ouvidoria e ter pesquisas contínuas de satisfação com esses públicos de interesse é essencial para entender e realizar ações para se manter sempre a frente dos problemas e críticas.
  • Conselho de Administração – A criação de um conselho independente e diverso, que possibilite uma análise crítica do funcionamento da empresa e auxílio aos gestores de maneira livre pode gerar bons resultados no médio e longo prazo.
  • Compliance e LGPD – É essencial estar de acordo com a legislação trabalhista, normas e regulamentos do seu setor de atividade, normas fiscais e contábeis, além de ter certificações que chancelem o bom funcionamento da empresa

Se sua empresa realmente se envolver nessas ações, existem inúmeros benefícios e impactos positivos que podem ser gerados como:

  • Evitar conflitos e casos de corrupção
  • Minimizar fraudes e atos ilícitos
  • Melhorar o gerenciamento de riscos
  • Valorizar a imagem da marca
  • Atrair investidores e aumentar o valor da empresa

Exemplos de Ações que se enquadram no G do ESG

Deixa eu te mostrar agora alguns exemplos práticos que podem te fazer entender alguns dos caminhos que você pode seguir na sua empresa. Para isso, vou entrar nas estratégias voltadas para o aspecto da governança corporativa em dois relatórios de sustentabilidade:

1 – Grupo Fleury

O Grupo Fleury é uma empresa de saúde brasileira fundada em 1926, cuja principal atividade é a prestação de serviços médicos e medicina diagnóstica.

O seu Relatório de Sustentabilidade 2021 tem uma seção inteira de ações e estratégias voltadas para a Governança Corporativa.

Relatório de Sustentabilidade do Grupo Fleury: Seção sobre Governança e Gestão de Riscos

Algumas das estratégias relacionadas à governança corporativa que eles se propõem a fazer são:

  • Gestão da empresa realizada por um Conselho de Administração e por uma Diretoria Executiva
  • Avaliação anual do Conselho de Administração seguindo as recomendações do IBCG
  • Criação de comitês para assessoramento do Conselho:
    • Auditoria, finanças, riscos e Integridade 
    • Cultura e pessoas
    • Transformação
    • ESG (criado em 2021)
  • Adesão ao Movimento Transparência 100% do Pacto Global

Abaixo você pode ver o detalhamento das atribuições de cada um dos comitês de assessoramento e os dados relacionados à diversidade da Diretoria Executiva:

Ações de Governança propostas pelo Grupo Fleury em 2021

2 – Natura

A Natura é uma empresa brasileira que atua no setor de produtos cosméticos. Fundada em 1969 por Antônio Luiz Seabra, hoje está presente no Brasil e em diversos outros países.

Aqui você encontra o relatório de sustentabilidade integrado deles e pode ver que eles tem uma seção interira para 

  • Governança Corporativa
  • Compliance
  • Gestão de Riscos
Natura - Sumário do Relatório de Sustentabilidade Integrado

As principais estratégias e ações dessa parte do relatório integrado deles foram:

  • Composição do conselho de administração contar com 70% de conselheiros independentes
  • Conquista do Selo Pró Ética da CGU (Controladoria Geral da União) em 2021
  • Modelagem inovadora do IP&L (Integrated Profit and Loss)
  • Processo de asseguração externa de auditoria de seus relatos conduzido pela PwC (PricewaterhouseCoopers)

Abaixo te deixo com o detalhamento do perfil de composição do Conselho de Administração deles, que como você vai perceber, poderia ser mais diverso. Em uma rápida análise vemos apenas 7,7% de negros e uma participação de apenas 30% de mulheres.

Natura - Relatório de Governança - Composição do Conselho de Administração

Sinergia entre o G do ESG e os ODS

Além das ações mais diretas listadas acima, caso você esteja implementando estratégias focadas nos aspectos de governança do ESG, pode fazer sentido ter um alinhamento desse planejamento com os ODS (Objetivos do Desenvolvimento Sustentável) mais relevantes (materiais) para o seu negócio.

Um dos primeiros passos que você pode seguir é da criação de uma matriz de materialidade. Assim, a sua organização pode ter mais noção dos tópicos ESG que devem ser alcançados e quais ODS tem relação com eles.

17 ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável)

Os ODS que mais tem sinergia com ações voltadas para os aspectos de governança são:

  • ODS 5 – Igualdade de Gênero
  • ODS 8 – Trabalho Decente e Crescimento Econômico
  • ODS 9 – Indústria, Inovação e Infraestrutura
  • ODS 11 – Cidades e Comunidades Sustentáveis
  • ODS 16 – Paz, Justiça e Instituições Eficazes
  • ODS 17 – Parcerias e Meios de Implementação

Para ficar mais prático, deixa eu te mostrar um exemplo. Em uma das iniciativas que sou sócio, utilizamos a captação de leads (contatos de e-mails) como motor de vendas. Uma das nossas preocupações (e de qualquer empresa que armazene dados de clientes) é com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Se a gente fosse traçar estratégias pautadas nos ODS, provavelmente os ODS 9 e ODS 16 seriam os mais relevantes para a criação dessas ações.

Referências no tema Governança

Existe diversas referências sobre o assunto, mas talvez um dos mais importantes é o livro Governança Corporativa e Integridade Empresarial, do IBCG. Ele é dedicado a gestores, conselheiros, investidores, auditores, consultores e profissionais que levam em consideração a lisura e a ética.

Uma outra boa leitura é o livro Compliance que traz uma visão geral com aplicações setoriais diversas de compliance e foi produzido por mestrandos da Ambra sob a organização de Éderson Porto.Para fechar as dicas, vale a pena acompanhar os eventos e artigos do IBCG – Instituto Brasileiro de Governança Corporativa.

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